quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Emblemas




Emblemas

Nestes trabalhos Daniel Oliveira reinventa um mundo com objectos que são retirados não só do quotidiano, como também nos aparecem roubados à infância e ao mundo dos sonhos- como se fosse possível alguém entrar no nosso mais profundo se e levar o que de mais precioso temos, construindo assim uma espécie de museu pessoal que poderia ser, no limite, o museu da humanidade.

A arte, como a religião e a filosofia, procura respostas mas, muitas vezes, o que acaba por encontrar são caminhos, fusões, espelhos. A arte consegue dizer-nos o que por palavras nunca conseguimos explicar, porque os tesouros não se dizem e as palavras não chegam. Estes Emblemas lembram algo de religioso por se assemelharem a relíquias banhadas a ouro, o mais precioso e também o mais perfeito dos metais. Muitas vezes associado à luz (da qual possui brilho) tem carácter solar e até divino: tanto a carne dos deuses como a dos faraós egípcios é feita de ouro, os ícones de buda são dourados (como sinal de iluminação e perfeição absoluta). Por isso, ao serem minuciosamente forradas a folha de ouro, estes objectos transformaram-se em alvos de culto e ganharam uma simbologia própria.

Longinquamente lembrar-nos-iamos dos ready-made de Armanm ou os objectos prateados de Lourdes Castro, mas o que o escultor pretende mão é trazer para o espaço museológico peças que pertencem ao nosso quotidiano, mas sim torná-las em algo que jamais poderá fazer parte do nosso dia-a-dia. Estes Emblemas possuem – tal como é inerente à própria palavra – um sentido simbólico e alegórico que faz com que, de certo modo, vejamos neles algo de primordial: por um lado estes objectos pertencem-nos, por outro ele deixaram de ser nossos porque foram transformados em algo maior a que já não podemos aceder.

Poder-se-ia falar de alquimia? É o artista um alquimista? Em certos aspectos estou convicta de que Daniel Oliveira o é, pois, ao tocar em matérias que à partida não seriam chamadas para o mundo da arte, transformou-as em símbolos, em objectos de culto idênticos aos que seriam as relíquias de santos.

Num tempo em que a religião nem sempre se encontra presente a as relíquias são bens supérfluos e descartáveis, estes emblemas – a escada da ascensão, a árvore da vida – ganham uma aura e parecem poder ajudar-nos numa busca do que é realmente a essência da vida. Assim nos reencontramos e fazemos as pazes com o sagrado.

Marta Guerreiro 2003

Historia Arte



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